3 de setembro de 2009

O Jardim Vulgar e o Ciclista Não Muito

Era uma vez um jardim. Um jardim antigo. Tinha tudo esse jardim: árvores, bancos, canteiros, flores, lagos, repuxos, fontes, senhoras e senhores. Senhoras de cauda a arrastar, senhores de bengala a dar a dar, e meninos e meninas a brincar.
Era um jardim catita, um jardim vulgar, sem nada de importante a assinalar.
Até que um dia, nesse jardim sem história, apareceu uma novidade que pôs toda a gente a olhar.
- Ah - admiraram-se as senhoras, os senhores, as meninas, os meninos e até o repuxo se esganiçou e mais alto se repuxou para ver a novidade.
O ciclista acrobata, que passava, passeava, fazia de conta que não dava pelas atenções que provocava e rolava, rolava, rolava...
Rolou assim que tempos, dias a fio, pelo meio das senhoras, dos senhores, das meninas, dos meninos e tanto tanto rolou que mais ninguém se admirou.
- Que importância tem? É um ciclista a passear no jardim. Deixem-no andar. Nós também andamos e ninguém pára para nos ver passar.
Por isso, quando o ciclista, um dia, desapareceu do jardim, ninguém estranhou. As senhoras continuaram a passear com a cauda a arrastar, os senhores com a bengala a dar a dar e o jardim vulgar, vulgar ficou.
(...)

António Torrado